“Nos meados de outubro de 1979, um grupo de atores se
juntou para, clandestinamente, montar Barrela,
que completava 20 anos de proibição pela censura.
A peça estreou em dezembro, no porão do TBC
[Teatro Brasileiro de Comédias, SP], gentilmente cedido
por Antônio Abujamra, diretor do TBC na época.
Os ingressos eram vendidos pelo próprio elenco que,
nas ruas, os ofereciam para as pessoas. Todas as sessões,
que eram realizadas às sextas-feiras, à meia-noite,
lotaram. Um êxito.”
·Em 1980, as peças
Barrela
e O Abajur Lilás
foram liberadas pela Censura Federal. E O
BANDO [nome dado ao grupo de artistas que se juntou em
torno de Barrela]
prosseguiu na luta. Barrela
faz um retumbante sucesso de crítica e de público.·
·Vinte e um anos depois de ter sido escrita, essa peça-reportagem
lamentavalmente ainda vale. Retratava a realidade dos presídios
há vinte e um anos, e ainda tem validade. Uma pena.
Pena, porque os méritos não cabem à peça.
É tudo culpa do país, que não evoluiu
socialmente. E, se continuarmos desse jeito, essa peça
vira um clássico.·
[O BANDO transfere-se para o Teatro Taib, SP, e monta, em
seguida, Dois
Perdidos Numa Noite Suja,
Oração
para um Pé-de-Chinelo
e Jesus-Homem.]
“E todas as manhãs, os atores e os compositores
do espetáculo saem às ruas distribuindo papeizinhos
(filipetas) para o espetáculo da noite. Nessa batalha,
houve muitos pererecos, pois logo a rapaziada percebeu que,
em São Paulo, distribuidor de bônus teatral é
mais perseguido do que vendedor de maconha em porta de colégio.”
“É preciso tirar o homem comum da casa dele.
É preciso inquietá-lo. O BANDO acha isso. E
acredita que é necessário montar peças
que retratem a realidade brasileira com toda crueza. Mas,
será que o homem comum vai sair de casa para ver e
escutar coisas duras? Então, antes da peça,
arma-se um show de música popular brasileira, com compositores
excelentes. O homem comum não lê jornais, não
fica sabendo dos espetáculos. Então, suprime-se
o anúncio dos jornais e se vai para a rua distribuir
bônus de mão em mão. Mas, o homem comum
não pode pagar o preço do ingresso. Então
se aluga um teatro grande e se cobra ingresso bem barato.
Mas, o homem comum precisa reaprender a converrsar. Nós
também. Toda a nação brasileira precisa
reaprender a conversar, depois de dezesseis anos de obscurantismo.
Vamos tentar reaprender. Trocar idéias, sem querer
impor posições. Faremos debates ao final de
cada espetáculo. Tudo pronto. Belo espetáculo
esse de O BANDO. Bônus nas ruas. Casa cheia. Debates
concorridos. E aí baixa a repressão. Bônus,
papeletas, panfleto não pode. Suja a cidade. Popularizar
o teatro não pode? Tem que poder.”
[O Secretário de Cultura do Município de São
Paulo autoriza a distribuição, mas O BANDO continuou
tendo dificuldades com a polícia nas ruas. Apesar disso,
a experiência foi um sucesso, pois somente Barrela
foi assistida por mais de 60.000 pessoas. Mesmo adotando o
princípio de dispensar qualquer verba governamental
e trabalhando com a redução do preço
do ingresso, O BANDO se manteve por mais de um ano, graças
a esse trabalho de divulgação dos espetáculos
nas ruas e ao sistema de cooperativa integralmente adotado
pelos artistas, o que valeu a Plínio Marcos o Prêmio
Mambembe de melhor produtor, pela eficiente forma de produção
adotada.]